Desfardar para Julgar: os limites do STF ao proibir o uso de farda por réus militares

Contexto fático

Em 28 de julho de 2025, o ministro Alexandre de Moraes, relator da Ação Penal 2.668, ordenou que nove oficiais do Exército retirassem a farda antes de serem interrogados por videoconferência no Supremo Tribunal Federal. Concedeu-lhes dez minutos para trocar de roupa, sob pena de considerar exercido o direito ao silêncio. A defesa protestou, alegando inexistir previsão legal para a determinação, e a audiência acabou adiada.

Ponto controvertido: pode o juiz regular a vestimenta do réu militar?

- Código de Processo Penal (art. 185): o interrogatório é ato de defesa; o dispositivo não confere ao magistrado poder para definir trajes.

- Código de Processo Penal Militar: tampouco há comando semelhante.

- Constituição Federal, art. 5.º, LIV (devido processo legal) e XXXVII (vedação a tribunal de exceção): limitam o poder de criação de regras ad hoc pelo julgador.

- Dispositivos sobre suspeição/impedimento (arts. 252-254 CPP; art. 5.º, XXXV CF) exigem magistrado equidistante das partes. Ao vincular o prosseguimento do ato a trajes civis, o juiz abandona a neutralidade e se apresenta como protagonista do litígio.

Regulamentos militares

O Regulamento de Uniformes do Exército (RUE – Portaria 1.660/2019) obriga o militar da ativa a fardar-se durante o expediente. Afastar-lhe o uniforme sem justificativa funcional constitui ingerência externa na hierarquia castrense. Ademais, os fatos imputados — planejamento de golpe — foram praticados “em razão da função” (art. 9.º, II, “c”, CPM); a farda exprime precisamente esse nexo.

Função x pessoa

O Magistrado sustentou que “a acusação é contra pessoas, não contra o Exército”. O argumento não convence: responsabilizar indivíduos não exige suprimir símbolos institucionais. Se a Justiça considera que a mera presença do uniforme influencia o público, deveria igualmente proibir toga, distintivos policiais ou símbolos religiosos nas salas de audiência.

Imparcialidade ameaçada

Ao ameaçar encerrar o interrogatório por causa de vestimenta, o juízo cria condição não prevista em lei — ato que põe em dúvida sua isenção. O Supremo já reconheceu, em precedentes sobre liberdade de vestuário de advogados, que restrições formais só se legitimam quando previstas em regulamento ou lei.

Síntese da violação normativa

1. Falta de base legal específica (CPP, CPPM, CF).

2. Interferência indevida na disciplina militar (RUE).

3. Risco de suspeição subjetiva e violação do devido processo.

Conclusão

Não cabe ao juiz determinar que militares acusados compareçam em trajes civis quando a própria acusação decorre de atos praticados no exercício da função. A ordem de retirada da farda carece de amparo normativo, compromete a imparcialidade do julgador e inaugura um precedente perigoso de intervenção judicial em prerrogativas funcionais.

Referências

- G1. “Moraes reafirma decisão sobre militares não usarem farda em interrogatórios e dá 10 minutos para militar começar a falar”. 28 jul. 2025.

- Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 5.º.

- Código de Processo Penal, arts. 185, 252-254.

- Código Penal Militar, art. 9.º, II, “c”.

- Regulamento de Uniformes do Exército – RUE (Portaria n.º 1.660/EME, de 7 nov. 2019).


Sobre o autor:

Temístocles Telmo: É Coronel veterano da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com 38 anos de atuação na área de Segurança Pública. Doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, é também pós-graduado em Direito Penal e atualmente é Secretário de Segurança Cidadã de Santo André. Advogado licenciado, atua como membro consultor da Comissão de Segurança Pública da 100ª Subseção da OAB/SP – Ipiranga. É professor universitário há 17 anos na área de Direito Criminal, com atuação na PUC-Centro Universitário Assunção São Paulo, no Programa de Doutorado da Polícia Militar do Estado de São Paulo e na pós-graduação da Faculdade Legale. Em 2023, coordenou os Conselhos Comunitários de Segurança da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. É autor, coautor e organizador de 14 livros, com destaque para Vizinhança Solidária. Além de escritor e articulista, também se dedica à poesia.

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