Limites da Magistratura e Prerrogativas da Advocacia: Uma Análise Jurídica à Luz do EAOAB e da Constituição Federal
Temístocles Telmo
Introdução
O Estado Democrático de Direito pressupõe o equilíbrio entre as funções essenciais à Justiça, e entre elas, destaca-se a advocacia, exercida com independência técnica e resguardada por prerrogativas legais. Contudo, recentes episódios — como o protagonizado por um ministro do Supremo Tribunal Federal ao interromper de forma ostensiva a fala de um advogado durante sustentação oral — evidenciam o enfraquecimento prático dessas garantias.
A fala do ministro, ao interromper o defensor com a afirmação “não são vândalos, são golpistas”, além de simbólica, é juridicamente preocupante. Este artigo propõe uma análise crítica da conduta adotada sob a ótica do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94) e dos princípios constitucionais do devido processo legal, ampla defesa, contraditório e presunção de inocência.
1. Prerrogativas da Advocacia: Garantias e Função Social
O artigo 6º do Estatuto da Advocacia estabelece, com clareza, que “não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público”, sendo obrigatório o tratamento com respeito recíproco. Já o artigo 7º, em seus diversos incisos, consagra direitos fundamentais do advogado no exercício da profissão, como a liberdade de manifestação em juízo, acesso irrestrito aos autos, e, especialmente, a imunidade profissional, prevista no §2º do mesmo artigo.
Tais prerrogativas não são privilégios pessoais, mas instrumentos indispensáveis à realização da defesa. O advogado não atua em nome próprio, mas como extensão técnica do direito de defesa do acusado — figura essencial à própria justiça.
2. O Devido Processo Legal e os Limites da Autoridade Judicial
O artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal garante o devido processo legal, ao passo que o inciso LV assegura o contraditório e a ampla defesa. O advogado, portanto, possui não só o direito, mas o dever de apresentar teses, argumentos e visões, ainda que desagradem o juízo. Interromper um defensor por discordância ideológica ou moral representa violação não apenas à liberdade profissional, mas à própria estrutura processual garantista.
No caso em análise, a interrupção da defesa e a tentativa de desqualificar seu discurso configuram grave cerceamento da defesa e comprometem a imparcialidade judicial, colocando em risco a legalidade do ato processual.
3. A Inversão Perigosa: Da Defesa Técnica à Criminalização do Discurso
Outro aspecto alarmante é a crescente tentativa de associar a defesa técnica à conivência com os atos imputados ao réu. Tal inversão lógica e jurídica é incompatível com a democracia e atenta contra os princípios mais basilares do Direito Penal e Processual Penal.
O defensor que sustenta uma tese em audiência não está legitimando condutas criminosas — está exercendo o direito constitucional de representar tecnicamente o acusado. Quando a magistratura trata esse exercício como afronta pessoal ou como “defesa do indefensável”, está, na prática, criminalizando a advocacia.
4. A Advocacia Não Se Intimida
Ao impedir o exercício pleno da defesa, não se afeta apenas o advogado — afeta-se o jurisdicionado e o próprio sistema de justiça. A advocacia precisa ser respeitada como função essencial à administração da Justiça, conforme o artigo 133 da Constituição Federal. Magistrados e promotores devem compreender que a crítica, a divergência e o embate jurídico são naturais e necessários ao processo. Cercear a palavra do defensor é ofender o próprio sistema acusatório.
Conclusão
O episódio protagonizado pelo ministro ao interromper a fala de um advogado em sustentação oral, além de afronta direta às prerrogativas da advocacia, revela uma perigosa tendência de concentração excessiva de poder e limitação do contraditório no âmbito judicial.
É fundamental que o Poder Judiciário, em todas as suas instâncias, compreenda que autoridade não é sinônimo de autoritarismo. As garantias da defesa técnica devem ser preservadas com rigor, pois representam muito mais do que um direito do advogado — são expressão viva da democracia constitucional.
Referências:
- Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
- Estatuto da Advocacia e da OAB – Lei nº 8.906/94
- CNN Brasil – Interrupção em audiência
Sobre o autor:
Temístocles Telmo: É Coronel veterano da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com 38 anos de atuação na área de Segurança Pública. Doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, é também pós-graduado em Direito Penal e atualmente é Secretário de Segurança Cidadã de Santo André. Advogado licenciado, atua como membro consultor da Comissão de Segurança Pública da 100ª Subseção da OAB/SP – Ipiranga. É professor universitário há 17 anos na área de Direito Criminal, com atuação na PUC-Centro Universitário Assunção São Paulo, no Programa de Doutorado da Polícia Militar do Estado de São Paulo e na pós-graduação da Faculdade Legale. Em 2023, coordenou os Conselhos Comunitários de Segurança da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. É autor, coautor e organizador de 14 livros, com destaque para Vizinhança Solidária. Além de escritor e articulista, também se dedica à poesia.
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