Proteção Infantil, Exposição Midiática e Risco de Censura Disfarçada


Temístocles Telmo

A recente polêmica envolvendo o influenciador Felca, o criador de conteúdo Hytalo Santos e as denúncias sobre suposta erotização de menores trouxe à tona um tema de relevância indiscutível: a proteção integral de crianças e adolescentes. A gravidade do assunto é inegociável, e qualquer conduta que viole direitos dessa natureza deve ser combatida com rigor.

Entretanto, o debate que se seguiu expôs um perigoso desvio de foco. A repercussão, potencializada pela visibilidade de Felca, acabou sendo instrumentalizada por setores políticos para defender agendas de “regulamentação das redes sociais” — propostas que, na prática, podem abrir portas para a censura e para a perseguição de opositores. A retórica de “proteger as crianças” passa a ser utilizada como pretexto para ampliar o controle estatal sobre a comunicação digital, repetindo uma lógica já vista em outros momentos históricos.

Ocorre que, ao contrário do que alguns discursos sugerem, não há vácuo legislativo sobre o tema. Nos últimos anos, o Brasil aprovou leis robustas para criminalizar condutas como a importunação sexual, a divulgação de material de abuso, a erotização de menores e a criação de cadastros públicos de agressores sexuais, a exemplo da Lei nº 13.718/2018, Lei nº 14.811/2024, Lei nº 15.035/2024 e Lei nº 15.160/2025. Além disso, projetos recentes — como o que criminaliza o uso de inteligência artificial para criar imagens de nudez falsas (deepnudes) — mostram que o arcabouço jurídico já é extenso e em constante atualização.

Portanto, qualquer tentativa de aprovar novas normas sob o argumento de “lacunas legais” carece de fundamento técnico.

Mais do que novas leis, é preciso garantir a aplicação efetiva das que já existem, fortalecendo investigações, promovendo campanhas de conscientização e, sobretudo, reforçando a responsabilidade e vigilância das famílias.

O uso político de pautas sensíveis não só enfraquece o debate genuíno como também desvia a atenção da sociedade das soluções reais.

É legítimo desconfiar de mudanças súbitas de postura de grupos e figuras que historicamente minimizaram ou ignoraram casos de erotização infantil, mas que agora se colocam como paladinos da causa para impulsionar projetos de controle da informação.

Interação de criança com artista nu em museu de São Paulo gera polêmica. Movimentos de direita falam em pedofilia. Juiz e desembargador veem 'histeria'. Museu diz que sinalizou sobre nudez em sala e que trabalho não tem conteúdo erótico. Por G1 SP — São Paulo - 29/09/2017  (1)

O episódio acabou se tornando um símbolo da tensão entre liberdade artística, moralidade pública e proteção de crianças, sendo explorado politicamente e gerando debates sobre censura, interpretação de obras e papel da arte na sociedade.

Em resumo: proteger crianças é prioridade máxima, mas transformar a pauta em cavalo de Troia para restringir liberdades é um risco real — e que exige da sociedade atenção redobrada.

Referências:

(1) https://g1.globo.com/google/amp/sao-paulo/noticia/interacao-de-crianca-com-artista-nu-em-museu-de-sp-gera-polemica.ghtml

Sobre o autor:

Temístocles Telmo: É Coronel veterano da Polícia Militar do Estado de São Paulo, com 38 anos de atuação na área de Segurança Pública. Doutor em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, é também pós-graduado em Direito Penal e atualmente é Secretário de Segurança Cidadã de Santo André. Advogado licenciado, atua como membro consultor da Comissão de Segurança Pública da 100ª Subseção da OAB/SP – Ipiranga. É professor universitário há 17 anos na área de Direito Criminal, com atuação na PUC-Centro Universitário Assunção São Paulo, no Programa de Doutorado da Polícia Militar do Estado de São Paulo e na pós-graduação da Faculdade Legale. Em 2023, coordenou os Conselhos Comunitários de Segurança da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. É autor, coautor e organizador de 14 livros, com destaque para Vizinhança Solidária. Além de escritor e articulista, também se dedica à poesia.



Comentários

  1. Bem isso, é preciso combater a exploração de crianças e adolescentes online, abraço Mestre

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